Ilustração por

Sobre contos e pespontos

Entre um conto e outro, alguns pespontos. Preciso dos pespontos para manter o principal equilibrado e firme. Preciso todo o tempo... Aprendi a pespontar quando a minha mãe me ensinou a fazer flores. Não, não se aprende a pespontar quando se faz flores. Essas apenas me lembram a minha mãe que me ensinou a pespontar os arranjos que a vida nos dá.



domingo, 6 de junho de 2010

O AMOR

                         Suzana C.Guimarães


Quando é que as portas se abrem
E o amor chega
E nos pega, nos enleva
E nos derruba
Ao chão?
Quando é que acontece,
O momento exato,
O dia do olhar, o dia da certeza,
Quando é que ele chega?
E nos invade e domina.
Nos prende no quarto escondido e só da alma;
Lá onde ninguém passeia,
Onde os passarinhos cantam
E o verde fica mais verde
E vemos frutas maduras nos pés,
Árvores em volta?
Quando é que o amor toma conta
Sem que queiramos.
E queremos sim,
E nós nos afrontamos,
O amor e nós,
Numa luta perdida e insana.
Onde não se vê vencedores
Nem vencidos.
E o corpo dói de desejo.
Quando é que o amor chega
Assim sem avisar,
Sem esperar resposta,
Sem que permitamos?
Pois eu não queria amar nunca
Porque ele dá e tira vida
E me engana
E ludibria.
Faz sofrer e chorar sem dó.
Por gosto, o amor, de se sentir mais forte.
Ah! Eu não queria o amor.
Nem nos meus mais loucos devaneios.
Eu não queria ter que senti-lo
Tão agudo e certo
Como uma flecha
Num arco retesado.
Porque se morre ao amar.
Se perde pedaços de nós
Ao vento, sem dó.
Porque tira o sono
E a razão
Perturba o coração.
E não há quem ajude,
Quem console.

Quem nos salve.
Eu não queria o amor.
Queria viver sem deparar com ele,
Numa esquina qualquer,
Num dia qualquer,
Num tempo qualquer
Que se eterniza
Numa janela de flores,
Num caminho à beira-mar,
Numa visão sem par.