Ilustração por

Sobre contos e pespontos

Entre um conto e outro, alguns pespontos. Preciso dos pespontos para manter o principal equilibrado e firme. Preciso todo o tempo... Aprendi a pespontar quando a minha mãe me ensinou a fazer flores. Não, não se aprende a pespontar quando se faz flores. Essas apenas me lembram a minha mãe que me ensinou a pespontar os arranjos que a vida nos dá.



sábado, 24 de setembro de 2011

CALMO AMOR



(fotografia, por SCG)

Não sei se era todo dia, mas era sempre. Eles iam para lá. Pular da pedra e mergulhar. Ele cantarolava ao ouvido dela, coisas que ela não entendia, mas era bom o som, era bom quando eles se apertavam entre as pessoas para assistir aos mergulhos." Águas cálidas", ele dizia. Ela tinha medo. Ele dizia "não diga que não pode, não diga que não pode". Ela passou a vida tentando dizer isso para si mesma, com pouco sucesso. Ela agora ouvia sempre, palavras saídas daquela boca que cantarolava uma singela música, que ela nunca entendia. "Águas pálidas, plácidas...", ele dizia, olhando o mar cinza prata agarrado aos céus, numa única visão. Era outono. Era quase frio, quase tarde. Ele pulava sozinho para ela aprender, para ela ver, para ela ir. Ele voltava e se encostava nela. Passava a mão no braço dela, uma vez, duas, três, várias vezes, pedia calor. Um dia, eles pularam juntos, abraçados. Antes do pulo, um segundo. Ele sentia o corpo dela tenso, suado, hesitante, a respiração quase em suspenso, os músculos travados, o medo estampado. Ele esperava. Olhava para ela. Olhava o mar atado ao céu, cantarolava a música e esperava sentir a hora, quando o corpo dela afrouxasse. E tchibum! Mar adentro, dois corpos quase juntos, quase soltos, quase noite, quase entregue amor.


por Suzana Guimarães

terça-feira, 20 de setembro de 2011

Ah, TUCA...



(fotografia de SCG, arquivo pessoal)

Mas, Tuca, nesta vida há quem se esconda feito rato no esgoto... ah, isso há, e lá, no esgoto, está cheio de computador.

Sua amiga,

Suzana Guimarães



Nota: isso não é ficção, apesar de estar postado aqui. É pura realidade.

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

DOCE HOMEM (V) - última parte



Cabelo graúna, minha doce ficção, lotada de pele, suor e risos.

Ah!, como tu me fazes rir, só de pensar, só de lembrar, só de pegar, só de escutar, só de tentar.

Cabelo graúna, eu poderia, ao ouvir tua boca dizer meu nome pela primeira vez, puxar esses teus cabelos, atirá-lo ao chão (como se fosse fácil!), eu poderia prendê-lo corpo a corpo na parede, de encontro ao teu riso calmo, certo, constante, macio, macio, feito tuas mãos nas minhas, feito o som das sílabas, todas elas, vogais, consoantes, com som, como antes, pronunciando meu nome.

Ah!, enfim, esperei tanto, pensei que jamais dirias. Mas rolou a língua para dentro de si, calcou o peito, prendeu ar e soltou devagar, reverberou, acentuando errado, mas encheu a boca e falou e eu que poderia sim, poderia sim, tu irias deixar, deixar eu lhe atirar do outro lado da sala, da areia da praia, do lado de lá do pier, por além dos arbustos do gramado, apenas levantei os olhos e olhei, gozei com o som, o tom.


por Suzana Guimarães





segunda-feira, 5 de setembro de 2011

DOCE HOMEM (IV)



Andam perguntando por ti enquanto você pergunta por mim... Você aguarda meu retorno e eu sempre a ti me movo, em giro lento de cabeça, passo calmo, riso manso. Andam perguntando, perguntando se você é delírio, quimera, você meu doce homem...

Saudades de teus olhos negros, teu sorriso em nossos olhos, transparentes, sem medos, sem janelas trancadas. Nosso palácio está vazio, barulhento apenas de nossos silêncios. E eu nem sei bem como dizer e apenas espero que você segure minhas mãos novamente, como se tocasse pétalas e eu olho isso, sim, eu gosto de olhar o que você faz, cada vez que ajeita minhas coxas para mais perto de ti, e desliza gesto. Amor é feito de gestos, amor tem mãos, tem tesão.

E deito a cabeça em teu peito, não, não em tempestades, terremotos, insanidades, deito minha cabeça em ti e me entrego, em tua pele, sim, amor é feito de peles, amor tem mãos, tem tesão... esse meu último segredo, entrego minha pressa... Pressa? Só longe de ti, só longe de teus olhos. A ti entrego minhas tolices, assobio de pássaro ao longe, só para ouvir teu riso ou alagar-me no rio escuro dos teus olhos.

Sou pétala de rosa branca pousada em tua pele amadeirada.

Sou sem adorno, pois o que carrego é apenas brilho nos olhos, quando os meus cansados e medrosos descansam nos teus.

Em teu cabelo da cor da graúna, eu toco, mas você pensa ser apenas mecha que escorrega e a puxa para trás.

Sou mulher fácil entre tuas pernas e quando teus olhos vazam os meus.

Você me olha e o tempo para e eu que sempre corri, corro, não. E eu que sempre disfarcei, disfarço, não!

Andam perguntando por ti. Eu, que nem sei mais de mim. 

                                              
 Por Suzana Guimarães


                                                                  DOCE HOMEM (I)

                                                                  DOCE HOMEM (II)

                                                                  DOCE HOMEM (III)

                                                                  DOCE HOMEM (V) - última parte


Pra ser amor, tem que ser feito.